EDÉSIO ADORNO
Cuiabá
Relevantes fatos sociais, políticos, econômicos, culturais, científicos e esportivos marcaram os anos 2000. Na telinha, o humorístico Zorra Total, da TV Globo, foi sucesso absoluto. O porteiro "Severino faz tudo", personagem interpretado pelo saudoso ator e humorista Paulo Silvino, com seu trejeito de afeminado arrancava gargalhadas dos telespectadores com o bordão “sua bichona” e sua inconfundível capacidade de “quebrar galhos” para os moradores do condomínio onde a trama se desenvolvia.
Paulo Silvino morreu de câncer no estomago em 2017. O Zorra Total já havia saído do ar. Mas, por ironia do destino ou para comprovar que a arte é apenas a representação da vida real, a TV Globo usou a morte de um outro Severino, este anônimo, como quebra-galho de seu jornalismo vampiro - que se alimenta de tragédia, desgraça social e sangue humano - para conquistar picos de audiência.
Sobre a presepada da TV Globo, escreveu o colunista Mauricio Stycer, do UOL:
O que homem morre de causas diferentes em dois telejornais da Globo no mesmo dia. “Um mesmo homem, de 60 anos, foi personagem de duas reportagens diferentes em telejornais da Globo nesta terça-feira (21). E a causa da sua morte mudou entre um telejornal e outro”.
Primeiro, no "Jornal Hoje", para ilustrar a difícil situação de pacientes em estado grave com outras doenças que não a covid-19, mas que não encontram lugar nas UTIs dos hospitais municipais de São Paulo. À noite, no "Jornal da Globo", a história do mesmo homem foi citada como exemplo de pacientes com a covid-19 que não conseguem leito em UTIs de hospitais públicos na cidade.
No "Jornal Hoje", a repórter Sabina Simonato narrou a história de Severino, que "teve um AVC e estava há dias no Hospital Municipal de Campo Limpo esperando por um leito de UTI", mas morreu antes de ser transferido.
À noite, no "Jornal da Globo", a repórter Patrícia Falkowski falou do mesmo homem, mas relatando que ele morreu de covid-19 sem conseguir o leito de UTI.