Da Redação
A Bronca Popular
Nos filmes americanos, o fora da lei (outlaw) é um arquétipo clássico, especialmente no faroeste: alguém que vive à margem da sociedade e desafia a autoridade e as normas estabelecidas.
Em geral, esses personagens enfrentam o status quo por acreditarem que a lei é corrupta, seletiva ou injusta.
Embora criminosos aos olhos do sistema, muitas vezes são retratados como figuras carismáticas — por vezes até heroicas — que lutam por uma noção própria de justiça. Diferem dos vilões simplistas porque carregam motivações complexas e histórias capazes de gerar empatia no público. Seus arcos narrativos costumam culminar em confrontos físicos e simbólicos com os xerifes da lei.
Bonnie e Clyde ou Josey Wales, eternizado por Clint Eastwood, são exemplos clássicos desse imaginário.
Longe das telas de Hollywood e com os pés fincados na realidade crua do Brasil, o fora da lei não cavalga pelo deserto: circula pelos corredores do poder. Daniel Vorcaro não enfrenta o Estado brasileiro — ele o captura. Sua epopeia não é de rebeldia, mas de submissão institucional. Em vez de balas, usa contratos; no lugar de revólveres, relações; e como escudo, a complacência da elite política.
É aqui que o roteiro brasileiro se torna ainda mais indigesto.
O todo-poderoso ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes — o “Xerife Xandão” — que não hesitou em condenar centenas de pessoas pela trama golpista e que avançou inclusive sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro, mostrou-se curiosamente dócil diante do fora da lei de terno e gravata.
Enquanto distribui penas severas em nome da defesa da democracia, celebrou o golpe de sorte doméstico: sua esposa, a advogada Viviane Barci Moraes, firmou um contrato estimado em cerca de R$ 130 milhões com Daniel Vorcaro.
O símbolo é devastador.
O xerife que não tremeu diante de multidões, políticos eleitos e ex-chefes de Estado, rendeu-se sem pestanejar ao poder do dinheiro. Parte desse montante, segundo críticos, teria origem em investidores incautos; outra, no fluxo generoso de uma classe política acostumada a comprar proteção e influência. O resultado é a imagem de um Supremo que pune com mão de ferro os inimigos ideológicos, mas fecha os olhos quando o fora da lei se apresenta com cifras milionárias.
Não estamos diante do bandido romântico que desafia o sistema. Estamos diante do fora da lei moderno: aquele que sequestra as instituições, coopta os xerifes e transforma a República em balcão de negócios.
A história nunca foi uma mãe benevolente. É madrasta. E filho adotivo é quem ainda acredita na pureza das almas sebosas que gravitam — ou mandam — no centro dos podres poderes da República.













