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POLÍTICA Segunda-feira, 30 de Setembro de 2019, 22:08 - A | A

30 de Setembro de 2019, 22h:08 - A | A

POLÍTICA / Produção indigena

Ibama libera terras indígenas em Campo Novo do Parecis para produção agrícola

As terras haviam sido embargadas por irregularidades ambientais em MT

Rubens Valente
Folha Uol



Em um despacho no último dia 23, o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, desembargou 22 mil hectares, atacou as multas aplicadas pelo órgão contra indígenas e fazendeiros e atraiu para si todos os processos que envolvem cinco terras indígenas pareci e nambiquara no noroeste de Mato Grosso.  

Essa área tem sido foco de pressão da bancada ruralista desde o começo do governo Jair Bolsonaro (PSL-RJ). Os ruralistas e associações indígenas querem a regularização do arrendamento, que eles chamam de "parcerias", das terras indígenas para não indígenas na região, a fim de produzir soja e milho em larga escala.  

Os ministros Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Tereza Cristina (Agricultura) chegaram a visitar as terras embargadas, em fevereiro, para manifestar apoio aos produtores rurais e parecis.    

Salles disse que os indígenas e fazendeiros “são perseguidos por agentes estatais, que, graças à visão ideológica da melancia [verde por fora, vermelha por dentro], suscitam as mais absurdas posições para menosprezar, minar o trabalho desse grupo

Na ocasião, Salles disse que os indígenas e fazendeiros “são perseguidos por agentes estatais, que, graças à visão ideológica da melancia [verde por fora, vermelha por dentro], suscitam as mais absurdas posições para menosprezar, minar o trabalho desse grupo”.

Ricardo Salles, ministro do meio ambiente, posa com índios para foto, divulgada em seu Twitter - Reprodução/Twitter O despacho representa o recuo de todos os atos praticados pela fiscalização do Ibama sobre o assunto na região.    

A área de fiscalização do órgão havia aplicado, em maio de 2018, multas de R$ 2,7 milhões contra produtores rurais e associações indígenas após confirmar, com exames laboratoriais, o plantio de soja e milho transgênicos em quatro terras indígenas. As sementes foram levadas à região por fazendeiros que fecharam contratos de "parcerias" com os índios.    

O cultivo e a pesquisa de organismos geneticamente modificados em terras indígenas são proibidos pela lei 11.460, de 2007.    

Ao todo, o Ibama aplicou multas de R$ 133,9 milhões contra 17 arrendatários não indígenas e R$ 6,3 milhões contra associações indígenas. O arrendamento é proibido pela Constituição, mas manifestações da Funai (Fundação Nacional do Índio) e do Ministério Público Federal sinalizam para a legalização da prática na região, que ganhou força a partir de 2004.    

As cerca de 47 multas aplicadas pelo Ibama, porém, estavam relacionadas apenas aos supostos crimes ambientais, não à questão das "parcerias", que foge do escopo legal do órgão.    

Além do uso dos transgênicos, os fiscais apontaram como irregularidades "fazer funcionar atividade de utilizadora de recursos ambientais e considerada potencialmente poluidora (atividade agrícola), contrariando as normas legais" e "impedir a regeneração natural de vegetação nativa", ambas previstas no decreto 6514/08.    

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Sobre o uso dos transgênicos, Bim concordou que a lei "é categórica em proibir tal prática", porém argumentou que "não ficou claro nas autuações a razão pela qual existe diferença de valor entre índios e não índios, já que se tratava de parceria que contava inclusive com o aval da Funai [Fundação Nacional do Índio]". Para o presidente do Ibama, a diferença pode implicar tratamento discriminatório.    

Bim também reconheceu, em sua decisão, que não se tem "propriamente a regularidade da área", tendo em vista "a não assinatura" de um acordo, ainda em fase preliminar, "nem o julgamento definitivo dos autos de infração". Porém, escreveu Bim, "as partes comungam o entendimento de que a minuta apresentada atende a todos, apenas faltando as opiniões do assessoramento jurídico do Ibama e da Funai, ou seja, a regularização está em curso".    

Bim diz que há a intenção dos indígenas de regularizarem a atividade e a necessidade de manter as lavouras mecanizadas nos moldes atuais até a implantação de projeto a ser elaborado pela Embrapa com a Funai, consoante o Termo de Ajustamento de Conduta anteriormente celebrado, juntamente com o Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria da República em Mato Grosso.    

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Os ministros Ricardo Salles (Meio Ambiente, esq.) e Tereza Cristina (Agricultura) com vestes indígenas. À direita, o ex-senador Cidinho Santos (PR-MT) e ao fundo, o deputado federal José Medeiros (Podemos-MT)

Sobre o impedimento da regeneração natural das áreas, Bim afirma que "terra indígena não é unidade de conservação, conforme parecer da Procuradoria Federal Especializada do Ibama, não havendo que se falar em dever se manter a vegetação intocada".    

Segundo ele, assim não seria possível "caracterizar o impedimento da regeneração natural, o que violaria a autodeterminação dos índios garantida pela Convenção OIT 169 [da Organização Internacional do Trabalho] de trabalharem a sua terra dentro dos limites permitidos pelo Código Florestal".    

A respeito do ato do embargo, Bim diz que ele "tem o objetivo de impedir a continuidade do dano ambiental, propiciar a regeneração do meio ambiente e dar viabilidade à recuperação da área degradada, razão pela qual se permite o levantamento do embargo mediante a comprovação de que as atividades desenvolvidas na área embargada já estão regularizadas".      

"Considerando-se que o trâmite do processo sancionador resta pendente de análise, mas levando-se em conta o interesse das partes na celebração do acordo e o tempo do exame de sua viabilidade jurídica, a melhor solução que se apresenta no momento é o desembargo imediato das áreas, até para se impedir, em última instância, o prejuízo que as partes querem evitar com o acordo. Quando da assinatura do acordo, a manutenção do desembargo de tais áreas ocorrerá por força do instrumento de resolução pactuado entre as partes, não mais pelo presente ato administrativo", disse Bim.

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